quarta-feira, 1 de junho de 2011

Aqui ninguém vai pro céu.


Quando a noite chega e a cidade se cala. Forçado pelos pensamentos me vejo lançado no deserto, sem noção de onde esteja a linha do trem de volta pra casa. Sem água, sem agasalho, sem rumo, eu vou procurando por alguma miragem. Mas eu não vejo miragem alguma, só sinto o vento frio que se entrelaça entre os meus dedos, passando pelos meus pés descalços, trincando a minha boca, rangendo os meus dentes, batendo o queixo e cortando o coração. Esse coração maldito, que se entrega, se maltrata, que se alimenta de algo que não se tem em troca. Não, não e não, eu não vou mais falar sobre este coração, deixa ele quieto, sofrendo, enquanto essa dor não passa me dê um gole de vida, deixa ele, logo logo ele sara, eu tenho fé. Quero falar sobre os meus pés descalços que não encontram o caminho certo, onde não exista escuridão, onde o céu não perturbe este coração que já quer descansar. Um caminho onde as luzes da cidade transmitam conforto e alegria, sim é de alegria que eu preciso nesse momento. De abraço reciproco, de sorrisos seguidos de palavras sinceras que me confortem e me encorajam. Eu preciso encontrar quem me demonstre carinho, é de carinho que eu preciso. Talvez eu encontre carinho naquela dos cabelos castanhos, um pouco distante dessa cidade. Mas não, eu ferrei tudo quando ofereci o sorriso dela pro diabo.. Eu ferrei, eu me ferrei, eu ferrei os meus trinta e três anos, ferrei a minha casa, a minha família, perdi a minha esposa, perdia a guarda das minhas duas filhas, sobrou apenas eu. E eu e meu cachorro vira-lata, meu cachorro vira-lata cego e leproso. E como ele eu me sinto sem perspectiva de vida, cansado lambendo as minhas feridas, e mesmo não querendo falar do meu cansado coração que insiste em bater, tudo o que me rodeia se concentra nele. E ficar aqui falando de tudo o que eu ferrei e perdi, só me faz sangra-lo cada vez mais. A vida, as pessoa, todas são envoltas e movidas por um coração. A merda de vida, a merda das pessoas, todas são ferradas por um coração. A droga de vida, a droga das pessoas, todas são perdidas por um coração. Seria esse coração o real motivo da vida? O que seria das pessoas sem um coração? Como seria todos os seres humanos sem emoções? Sem a merda das emoções! Como seria se todos abrigassem pedra ao invés de um coração?. Eu queria ser um robô. Eu queria não ter memória, nem lembranças, nem sorriso, eu não queria nem poder falar. Nem falar, e nem pensar, porque ai eu não pensaria. Não pensaria em tudo, não pensaria em nada. Assim eu vou andando por esse imenso deserto, me debatendo sobre essas merdas, malditas supostas razões da vida. Eu queria ser aquele condor que voa pelo céu. Pois o céu não é de Deus, o céu é dos condores. Se eu fosse um condor eu não estaria com os meus pés cortados, não haveria poeira em minha boca, nem areia em meus olhos, nem roupas rasgadas, nem frio, nem lágrimas de sangue. E essa vida é realmente uma merda mesmo, se eu fosse o condor, eu estaria pairando pelo ar, de olhos fechados, sentindo a brisa do céu, a força do vendo em cada batida das minhas asas, com minhas lindas penas vivas. Eu também poderia ser um anjo, eu poderia ser um anjo com as asas bem pretas, e que a minha palidez se destacasse nesse mar de areia. Eu queria ser um anjo. Um anjo que nem aquele que se aproxima. Que se aproxima e me mostra a morte. Me mostra a morte me acordando deste sonho.

Danilo C.

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